terça-feira, 30 de novembro de 2010

"Poeteria Crônica"

(texto que inaugurou o blog de mesmo nome em outro endereço em 2007)

Eu queria poder fazer poemas
Fazer poesias
Uma “poeteria” qualquer
Poesia para se declamar na frente da sala de aula
Todos com seus narizes sobre suas carteiras e cartilhas
Eu queria ter um armazém de poemas
Para estocar paisagens sonoras
Uma fábrica de poemas para distribuir gratuitamente
Para os famintos que nunca poetaram
Franzinos a temer
Famintos a tremer
Na mesmice corriqueira
De um dia-a-dia sem vitaminas literárias
Sem beleza para se ter
Para se ouvir
Ou para se ver
Eu queria poder arquivar
Salvando em mil pastas patéticas
Cheias de pantomimas pândegas
Todos os desejos de desamor
Que enchem os olhos a dar água na boca
Alagando com notas musicais
Os ouvidos úmidos de saliva.
Poderia “poeteria”
Poder ter-rir-ir
Teria-iria.
Gozaria...
Suposições hipotéticas
De uma redundância perdida
Entre o bem e o mal.
O ócio e o aço
O cio e o lasso
O cujo e o tal
Estocar caixas
Estocar-estocar-estocar
Potes de R$1,99
Vidrinhos vagabundos
Reuniões de Tuperware
Somente para encher-encher-encher
E estocar aos montes a poesia
Para tecer uma imensa cortina
Para proteger as retinas
De um mundinho tão medíocre e vil
Cortina essa
De estampas sórdidas
Bordadas por fio sem brio
Por mãos sujas
De quem nunca respirou poesia qualquer
De quem nunca amou sem pensar em nada
De quem nunca se sentiu tão intimo do vento
Mas para que supor isso ou aquilo?
O que poderia ser?
O que poderia ter sido?
Apenas poderia
Poderia
Pensamento nosso de cada dia
Poderia
Poeteria
Poeteria crônica.
Cronicamente viável.



domingo, 21 de novembro de 2010

"As Nuvens e o Atirador de Facas"


O atirador de facas
Agastado
Atira facas em nuvens
Porção de fumaça
Acerta em vãos
Nuvens que vêem e vão
O atirador incansável sabe
Que atira em algo tão inatingível
Insiste em vão
Inabaláveis seguem incólumes
As nuvens alvas continuam seu desfile celeste
Inalcançáveis
Diante do arremessador de armas brancas 
Passeiam como imaculadas ovelhas
Inermes em carrossel
Dispersas como Virginia Woolf
Lobas em máscaras de virgens
De massa de vapores
O atirador com os braços doridos cessa
As nuvens agora cinzentas chovem e banham o atirador
Ovelhas de mijos cristalinos
Ele encharcado se purifica e as enaltece
Arrepende-se de sua guerra santa particular
Nuvem mal humorada abandonada por seu carneiro
Lança um raio distraída
Faca metálica afiada e ponteaguda
Só que ela não erra o alvo como o atirador de facas.

Mééééééeé!!!!