"A Mulher que partia..."

A Mulher que partia...

Partiu o retrato em dois

Fazendo duas fotografias

Partiu a casa em duas

Quebrando a monotonia

Partiu o bolo antes dos parabéns

E a criança armou um berreiro

Partiu a cama de casal

Fazendo duas de solteiro

Partiu a cara da amiga

Fazendo assim uma inimiga

Partiu a saia ao meio

Fazendo aparecer as ligas

Partiu a porta em dois

Fazendo a rua entrar para dentro

Partiu para a rua

Com pequena bagagem de mão

Partiu seus sonhos

Fazendo multiplicarem-se

Partiu para pescá-los

Fazendo sonhos talvez realidade

Seguiu assim sobre seus saltos altos

A mulher que partia...

Fazendo da casa... porto...

Do asfalto... mar...

Da mente... nave...

A navegar...

"Casa Biscoito"

A casa se oferece

Promete-se e se mete

Tão bela e faraônica

Tão limpa e impecavelmente

Tão harmônica

Desata-se e exibe-se

Decepciona

Desafinando na sinfônica

Esfarela-se

A farinhar-se sem ar

Esmigalha-se antagônica

Despedaça-se

Esmiúça-se histriônica

Desmancha-se

Nem se fuça

Nem se degusta

Desfaz-se em 8

Não houve nada

Não houve nem ao menos coito

Sem sabor

Insossa

Sem recheio

A casa vira pó

Das pontas ao meio

É a casa biscoito

Nem vou lamber os dedos

Somente limpar a sujeira que deixou.

"A Rainha Louca"

A rainha louca

Acordou somente de touca

Pois que, arrancou a roupa

Arrancou a roupa

Pensou em vingança

Achou muito pouca

Saiu na sacada do palácio

A cantarolar com voz rouca

Eu sou a louca!

Eu sou a louca!

Subiu na mesa do jantar e disse:

Sou a galinha da sua sopa

Na sala ouviu na vitrola Maysa

Cantando “Ouça”

Pegou os vassalos

E quebrou toda a louça

No imenso closet

Fez uma orgia vestindo

Apenas sapatos e bolsa

Foi até uma escola e escreveu

Um cabeludo palavrão na lousa

Eu sou a filha daquela...

A filha daquela rainha tão augusta

A filha da mulher bela e enxuta

Filha de rainha tão arguta

Eu sou a filha da...

Chuta! Chuta a coroa e fuja!

Correu nua pela rua a esbravejar!

Eu sou a louca!

Eu sou a louca!

Encontrou um saco de lixo vazio a voar

Não hesitou em usar

Fez um vestido bem mixo.

Passou a gritar

Sou a Rainha do lixo!

Sou a Rainha do lixo!

"O Colar"

Colar... colar...

Conto o tempo passar

Assim indo e vindo

No seu vai e vem

Conto o tempo entre contas

Tantas contas pra lá e para cá

Conto o tempo para que eu dure

E que o fio de vida se perdure

Já pensou eu arrebentar

E nossas tantas contas de vida no meio da rua a rolarem?

E você sobre seus saltos desesperada a catar uma a uma!

Bem provável que reflita e desista de me ter em seu pescoço

Essa pressa do seu horário de almoço

Não estarei mais em seu colo

No vão de seus seios

Oras com decote discreto

Outros bem pronunciados

Dias de vestido bem fechado

O que será que deu nela?

Já até mergulhei no prato de sopa
Quase me afogo

Melhor me deixar de vez em quando no armário

Entre outros modelos tagarelando 
Contando Suas aventuras da rua

Afinal, já que não posso colar em seu pescoço

Nem mesmo quando fico prensado entre seu peito e o do moço

Que sufoco!!!