sexta-feira, 27 de março de 2015

"A Janela do Lado"



(texto antiguinho, primeira fase, escrito faz 25 anos em média, qualquer pieguice é mera imaturidade).


É noite,
Num beco.
Muito depois das oito,
Um grito,
Um coito,
Ela desesperada,
Ele afoito,
Ela com medo,
Ele doido.
Mãos desgovernadas,
Pele suada,
Corpos entrelaçados,
Sonhos molhados.
Vontade,
Desejo,
Um berro misto de beijo.
Sem alarde,
Sob um lampejo.
A chuva molha-os,
O trovão abafa o som,
O delírio toma conta
Como se fosse uma invasão.
No prédio ao lado

Alguém sem querer

Os vê de uma janela,
Os olhos se arregalam,
Benze-se,
Mas os venera.
Ambos se procuram
Numa busca sem fim,
De dedos,
De tato,
Numa viagem de curvas,
Rasgando o vestido carmim.
O fecho éclair é supérfluo,
A intimidade é aberta,
O ato é um objetivo,
O prazer uma descoberta.
Triste é ter que acabar,
Horror é nunca experimentar.
Censura são crianças famintas na rua,
Proibido é reprimir um gemido.
Mas no dia seguinte
Quando amanhecer,
Vai estar tudo apagado
Como se a chuva os tivesse levado,
A única testemunha além do beco,


Será alguém da janela do lado.