segunda-feira, 30 de abril de 2012

"A Volta da Mulher/Cama"




Entre tecidos e texturas, flores e listras, às vezes em muitas cores ou em apenas tons pastéis vive a Mulher/Cama, entremeando pompons, rendas e franjas .

Só vê a luz dos abajures e ilustres lustres, conversa com os criados mudos, revira álbuns do guarda-roupa, submissa espera alguém bater a porta, reza para que não demore.

Sobre quatro pés, entre quatro paredes, de quatro...
Seus seios macios como um travesseiro, seu corpo quente como um edredom. Os envolve e os protege do frio, homens tão frágeis longe de suas mães.

Ela, a Mulher/Cama sabe que só o tem ali, na alcova.  Seu amante não se farta em dizer:

- Nos damos bem só na cama, nos entendemos somente no quarto, combinamos só na cama, não nos amamos, mas quando encostamos nossa pele, acabamos entre lençóis.

Ela não se cansa de encontrá-lo por aí, mas sempre está só, fora de quartos de motel, quartos de hotéis sórdidos, ora uma pousada poeirenta...
Não se cansa de se prometer que será o último dia, a última hora, a última vez, assim fica estática e só admirando o dossel da cama de sua casa solitária, seu modesto céu de tecido algodão azul. 

Espera que o telefone toque e que seja ele arrependido prometendo deitar-se sobre ela... somente sobre ela e mais ninguém.

O telefone toca... e ela volta...

Pensa em poder se desdobrar em várias para satisfazê-lo... e tentar migrar de vez para outros cômodos, outros ambientes possíveis... mesa... banho... e finalmente poder estar na sala de estar...



sexta-feira, 20 de abril de 2012

"lacuna"




...
meu conjunto vazio...

local predileto de encontro
com o branco
com o nada
nada mais necessário
de suprema importância
eu e ninguém
o vácuo
o inexistente
ou o desconhecido
sala de branca alvura
nuvens flutuantes de silêncio

“Aqui no hay banda”

lá... 

cuna...

não sei bem a hora certa de sair...

a porta bate...

porque saio para comprar mais espaço...
...



terça-feira, 10 de abril de 2012

"...fly - fly - hell..." - 11a. anotação da profaninha...






...moscas moscas moscas, em volta de mim, sempre assim, muito mais que mosca, morfética, matrona, mesquinha, maquiavélica, mesmo assim, moribunda, mendiga, mesmo assim misteriosa, melindrosa, mesmo assim melíflua, mártir, mística, mestiça, mesmo assim, monstruosa, mefistofélica, matei mais uma, one fly, one fly, zuuummm zuuummm zuuummm...

(...sinto que a vida do ser humano é tão idiota quanto a das moscas, a única diferença é que elas nascem, vivem e morrem em média de uma a quatro semanas, felizmente, pobrezinhas, acho pouco, quero dizer... acho muito, zuuummm... acertei mais uma merdinha, mortinha... acho que deus faz assim com a gente, oba matei mais um ser humano! mais uma gentinha... paradise is hell, ops, is here...)


ass. josephinne fly




quarta-feira, 4 de abril de 2012

"A Volta da Mulher/Coelha"





Nunca me esquecerei da Mulher/Coelha, matriarca faminta e voraz. Protetora, acolhendo todos a sua volta nas noites frias. Ainda que velha, cheia de filhos, netos, e bisnetos a procriar, a procriar, multiplicando-se a se espalhar, povoando selvas/cidades de si. 

Só me lembro dela anciã a espiar os rebentos no quintal tomado pelo mato do semiabandono, armários de madeira envelhecida a céu aberto com portinholas e janelinhas escancaradas e caídas revelando os bichos. Eles... lá dentro... arquivados, de todas as cores e tamanhos, quase imóveis se não fosse pelos narizes inquietos. Na noite o vermelho dos olhos disputava com o brilho das estrelas. 

Ela orgulhosa espiava da janela da cozinha, já idosa com seus olhos grandes e reluzentes, a boca/nariz disposta como focinho e as orelhas que cresciam com a idade, baixinha, gorda, arcada e insaciável...

No passado, antes da cidade, afoita e jovem, roedora e notívaga caçava nas matas, nua em pelos e voltava pra toca/casa só ao amanhecer, alegre e saltitante com a boca suja de sangue, insatisfeita com a dieta de cenouras, assim dormia ao lado do marido que fingia não saber.

Nunca me esquecerei, ela já se foi e estive em sua casa, mas ela sempre volta saltitando em meu pensamento... coelha... alegre... lebre... leve... roendo fios de memórias.