quarta-feira, 24 de julho de 2013

"Casa Reinaugurada"









Reinaugurar, nem mesmo quero dizer que a inaugurei um dia, talvez apenas em pequenos atos simples e pensamentos.


Agora reinaugurei, também sem festa, apenas pequenos atos simples e decisões e pensamentos.


Praticamente a inauguração se deu aqui com você acidentalmente entrando e saindo e ficando aqui dentro...


Falo da casa imóvel, aquela que habito, que arrumo, pinto, limpo, na qual reflito.


Falo da casa móvel, meu corpo, que habito, que arrumo, limpo, no meu teatro pinto, na qual reflito...


Agora entrego a casa da qual você não veio mais, não tocou, não bateu, entrego a outros moradores, estranhos visitantes, os chamo, os entrevisto, alguns não passam, reprovam, mas eles veem e agora entram no seu lugar, que não é mais seu, eles entram, passeiam, brincam e se lambuzam e ficam e uma hora vão embora.


É bom reinaugurar a casa que nunca foi verdadeiramente inaugurada, agora quero ela sempre assim em clima de festa, gente entrando e saindo, não mais aquela rotina entediante, pacata e mesquinha, museu empoeirado de tédio. 


Agora aqui é parque das diversões proibidas que aqui se permitem, basta passar na entrevista.


Venham... a porta esta aberta...


sexta-feira, 12 de julho de 2013

"Doce partida de quem nunca chegou"






     Hoje eu ouço as teclas do piano como a água corrente que desprende e acalma. Bonança pós tempestade. A tal água lava a sonoridade do que já foi dito e nunca se escreveu. As doces palavras na boca do ouvido úmido, monólogo sucumbido de saliva quente sobre outro corpo assim como:

- Saudades...
- Te adoro...
- Adoro te fo...
- Beijos...


     Agora de tua presença há somente o tal Vazio na rua, o senhor Silêncio na sala, certo e possível Frio na cama.
     Depois de colocar meu coração no moedor de carnes pra rechear pastéis e fritá-los, sapateio, como Fred Astaire, gargalhando sobre as quireras  de sua passagem (quisera eu insignificante).
     Concluo então que é impossível se perder o que nunca se teve ou mesmo sentir a dor do que nunca foi amor, ou então dar adeus com lencinho branco na mão a quem nunca partiu de qualquer estação, o estar são. Carro sem rodas, barco sem velas, estação abandonada, coração... cor... ação...

     Pois ninguém parte se nunca chegou. Bagagem nunca concluída, malas nunca desfeitas. Aeroporto em pós guerra.

    Cinzento jardim de destroços bélicos, futuras infames flores nefastas de amanhã.

    Olá pra quem vai... 

   Adeus pra quem chega...


    Ainda bem! Há o piano incessante incansável... esbravejando em delírios...




quinta-feira, 4 de julho de 2013

"Cicatrizes"






As cicatrizes falam. Sim as cicatrizes cantam, elas não encantam, somente na época em que ainda não eram cicatrizes. Elas nunca deixam de existir, sempre estarão ali, sempre... pra não nos deixar esquecer o que aconteceu - aquele dia, àquela hora, naquele dado momento... ele surgiu.


E fico me perguntando incessantemente como seria se eu não estivesse naquela sala? Naquele dia e naquela hora? - numa fração de segundos. Olhos vendados pela distância. Mãos atadas pelo abismo.


Acredito que morremos sem levar na bagagem a explicação de muitas coisas, entre estranhos fenômenos existem as duvidas mais singelas, que começam com - por quê? Por que dissemos isso? Por que fizemos aquilo? Por que não foi diferente? É o que sempre digo, - são as escolhas...

A porta azul e não a vermelha, que de cor mais amena, levou a ti a um caminho ainda mais longo e tortuoso, andou em círculos por anos e anos e talvez a vermelha seria um jardim agradável e profícuo.

São as escolhas sempre, atravessar a rua agora? Dizer sim ou não àquele convite?


Não sei...


A inércia também pode ser uma escolha. Como entender? Não entender. Às vezes é melhor guardar a curiosidade que passará, e ficar sem saber. O silêncio pode ser mais precioso que a cruel verdade, ou então não, escarafunchar toda - ela ferida - até o fim, pútrida, fétida, pustulenta e suportar a grosseira e demorada cicatriz que de tempos em tempos não se cala, lateja e oras sangra como virgem.


Calar as cicatrizes e virar a esquina, suspirar e engolir a pedra na garganta, é mudar a música que toca. As cicatrizes são cactos de formas humanas nos assombrando em risinhos uivantes ao vento que cantarola no meio do deserto de sua mente inquietante, passado que não passa, passa o ferro, não desamassa o passado amarfanhado que foi ontem.


Às vezes a melhor escolha para a cicatriz, é não atender o telefone, não ouvir o interfone ou a campainha, virar a página... passar... passar...


Ponto final.